INCRA CHEGA AOS 44 ANOS DE FUNDAÇÃO SEM TER O QUE COMEMORAR

Há tempos que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) faz aniversário sem ter o que comemorar. Por vários anos essa rotina melancólica, deprimente e irracional tem deixado claro que o Incra é uma instituição que sofre de Incra 44 anos 2paralisia em seus projetos e ações (pensados para não funcionarem), provocada por sucessivos governos que não têm coragem de enfrentar o “agronegócio”. Como dito em outras oportunidades, essa falta de coragem decorre de uma frouxidão do governo federal ao não enfrentar um dos problemas básicos que atingem o meio rural brasileiro – que é a concentração de terras e riquezas nas mãos de pequeno, mas poderoso, grupo de ruralistas, mantendo milhões de brasileiros na extrema pobreza e sem perspectivas de melhoria das condições de vida.

 

O dia 9 de julho de 2014 não foi diferente, pois o Incra chegou na data aos 44 anos de fundação sem nada o que comemorar. Sequer uma mensagem lembrando a data seus gestores repassaram aos servidores do Instituto.

 

A paralisia atual do Incra é paradoxal ao “passado glorioso” de um órgão que foi responsável por levar cidadania a milhões de brasileiros por meio de colonização e assentamento, o que possibilitou o surgimento de centenas de cidades e vários estado nas últimas décadas. Claro que muitas destas ações do Incra nas duas primeiras décadas de sua fundação estavam ligadas à política da ditadura militar, resumida no lema:  integrar para não entregar. Com uma ação de ocupação de áreas, principalmente na Amazônia Legal (que além da região Norte do Brasil, tem também parte do Maranhão e Mato Grosso), os militares buscavam combater dois grandes perigos ao regime: o primeiro, real, uma reforma agrária em terras já concentradas no Sul, Sudeste e Nordeste; o segundo, um engodo, a tomada da Amazônia por países ricos (da Europa e América do Norte). O instrumento que foi utilizado para isso foi a criação do Incra, em 1970.

 

Entre 1970 e 1985, o Incra foi vigorosamente instrumentalizado para realizar uma “Política de Estado”, que se revelou, para dizer o mínimo, extremamente equivocada já que implicou em um perverso deslocamento de populações e um profundo processo de agressão ao meio ambiente. Assim, após anos de incentivos à ocupação da Amazônia nos programas de colonização oficial, de colonização particular e de regularização fundiárias de grandes áreas, estes foram simplesmente abandonados, ao invés de serem submetidos à imprescindível correção de rumos que os tornassem em consonância com o Plano Nacional de Reforma Agrária, que se instaurou com o início da “Nova República”.   

 

Novamente chamado a realizar uma política estratégica, desta vez com o objetivo inegavelmente fundamental para o desenvolvimento do País, de desconcentração de terras nacionais, apontado incisivamente para o combate à situação de miséria do campo brasileiro, com a incorporação de milhões de hectares ao processo produtivo e gerando trabalho e renda a milhões de brasileiros despossuídos. E o Incra respondeu com plenitude às demandas que lhe incumbiu a sociedade brasileira.

 

AÇÕES x SERVIDORES

 

O Incra, entre 1985 e 2014, teve o seu quadro de pessoal severamente reduzido de 9 mil para 5,3 mil servidores - uma subtração de aproximadamente 37% na sua força de trabalho. Nesse mesmo período, sua atuação territorial foi acrescida em 33 vezes – saltando de 61 para mais de 2000 municípios.

 

Concomitantemente, o quantitativo de Projetos de Assentamento aumentou em 135 vezes – saindo de 67 para 9 mil unidades, cuja área total passou de 9,8 milhões de hectares para pouco mais de 80 milhões de hectares – representando um incremento de 8 vezes.

 

Já o número de famílias assentadas passou de 117 mil para aproximadamente um milhão, ou quatro milhões de pessoas – encerrando, assim, um verdadeiro paradoxo entre um crescimento vertiginoso de serviços e uma redução drástica de meios para atendê-los de forma consequente. De forma global, o Incra tem um público beneficiário (atendido diretamente pela autarquia) de cerca de 10 milhões de pessoas – entre assentados, acampados, quilombolas, ribeirinhos, moradores de Resex, comunidades tradicionais, etc .

 

Ressalte-se, que dos atuais 5,3 mil servidores, cerca de 40% já reúnem condições para se aposentar, significando um agravante a mais a essas inaceitáveis contradições. Até o final de 2014 pelo menos dois mil servidores do Incra terão tempo de trabalho e idade para se aposentar. Avalia-se que sem perspectivas e vantagens para ficar na ativa, nada impedirá que esse quantitativo de servidores passe para a aposentadoria assim que for possível.

 

FORÇA DE TRABALHO

 

A atual força de trabalho do Incra é de aproximadamente 5,3 mil  servidores, reconhecidamente insuficiente para o exercício de suas atribuições, em padrões aceitáveis de qualidade. Tal situação é substancialmente agravada pelo desequilíbrio entre a realidade fática e o que devia representar um quadro ideal de pessoal, admitido como necessário para Instituição.

 

Nesse contexto, para além das insuficiências de profissionais - sentido genérico -, chama atenção o fato de que mais de 60% dessa força de trabalho ser constituída de servidores de nível técnico/intermediário, em grande parte com cursos de graduação e/ou mesmo pós-graduação em Administração, Economia, Direito, Comunicação, Agronomia, Contadoria, Engenharia, Análise de Sistemas, Arquitetura, Pedagogia, entre outros, com reflexos altamente positivos em relação à performance institucional, sem que isto se reverta em compensação em termos de expectativa funcional ou valorização profissional.

 

Soma-se a esse quadro qualificado, por sinal sub-aproveitado, o acúmulo de conhecimentos em várias áreas de ação do Incra, administrativas, cadastrais, etc., passando pelas de implantação, estruturação e desenvolvimento de projetos, mediação  de conflitos, além das funções de confiança exercidas em setores estratégicos da instituição. Corrigir, portanto, essas distorções, na perspectiva da estruturação de um quadro de pessoal que faça jus a missão do Incra, sob seus aspectos numérico e qualitativo, é um desafio a ser superado na linha do restabelecimento pleno da instituição, concomitante à recomposição de sua força de trabalho e a valorização de todos os seus servidores.

 

DESCRÉDITO

 

Quando o Incra fez 35 anos de fundação houve até lançamento de livro, no qual reunia artigos produzidos por servidores com histórias e eventos dos quais participaram e evidenciavam a importância e crédito que tinha o órgão para o desenvolvimento do Brasil. Nos anos seguintes, praticamente nada foi feito durante os aniversários da autarquia.

 

Em 2014, o desânimo e a falta de perspectivas entre os servidores só aumenta ao chegarem no dia do aniversário do órgão onde trabalham e pouco sobre o assunto é ouvido. Não existe projeto algum para reestruturá-lo no sentido de tornar o Incra um órgão senhor do desenvolvimento do Brasil, responsável pela soberania territorial (pois é quem gerencia o cadastro de terras no País) e a segurança alimentar – já que boa parte dos agricultores familiares que produzem 70 por cento do alimento que chega à mesa do brasileiro é assentado, quilombola, ribeirinho, etc.

 

A falta de crédito do Incra por parte do governo ficou mais evidente depois de 2012, quando os servidores da autarquia realizaram uma das maiores greves de toda a história do Instituto, paralisando cerca de 70 por cento das atividades do órgão. O movimento foi um sucesso de participação dos servidores, de apoio político / parlamentar (pelo menos 140 importantes líderes nacionais explicitaram apoio ao movimento de reestruturação do Incra) e de mídia - que em diversos momentos deram total destaque para as reivindicações da categoria, com manchetes nos principais jornais, emissoras de TV e rádio, além de agências de notícias do Brasil. Mesmo com esse volume de participação e apoio o governo apresentou proposta muito ruim, que trazia aumento dividido em três anos (2013, 2014 e 2015), sendo que para cerca de 70 por cento dos servidores do Incra (todos os de nível intermediário/auxiliar, da ativa e aposentados, e o nível superior de início de carreira) receberiam aproximadamente R$ 200 líquidos por mês. O aumento maior foi para o nível superior de final de carreira.

 

Fazia parte do acordo de 2012 realizar reuniões entre servidores e governo para reestruturar a carreira de Reforma e Desenvolvimento Agrário. Em 2013 houve apenas duas reuniões, mas sem evolução alguma. Em 2014, nada.

 

Após o veto da presidente Dilma Rousseff  ao Capítulo XXIV do Projeto de Lei de Conversão (PLV) 5/2014 (publicada no Diário Oficial da União do dia 20 de junho de 2014), decorrente da Medida Provisória 632/2013, que reestruturava as carreiras do Incra – “Reforma e Desenvolvimento Agrário” e “Perito Federal Agrário” -, o governo convidou as entidades representativas, entre as quais a Cnasi, para conversar. E o que saiu dessa conversa foi algo melancólico, deprimente e profundamente ilógico. Os interlocutores do governo – ministro do MDA, Miguel Rossetto, e presidente do Incra, Carlos Guedes -, disseram que está sendo gestado um projeto de “novo Incra”, a ser apresentado, em 2015, ao novo governo eleito.

 

Mas que “novo Incra” é esse? Que projeto maduro e fantástico está sendo desenvolvido pelos magnânimos cérebros da Esplanada e Planalto? Várias notícias apontam que é mais do mesmo do que ocorreu nesses últimos anos: reduzir a autarquia a uma mera secretaria burocrática para não prejudicar os planos dos ruralistas, acabar com a Reforma Agrária, com a soberania territorial (já que o capital não tem fronteiras), etc. Essas informações dão conta que com a aposentadoria dos dois mil servidores do Incra, já em 2014, que reúnem condições para isso, ficariam cerca de 3,3 mil profissionais no órgão e mais fácil de dobra esse grupo de trabalhadores. O projeto de “novo Incra” irá definir novas atribuições ao órgão, que pela pouca importância que terá (basicamente responsável pelo desenvolvimento de assentamentos já criados) será transformado em apenas uma secretaria do MDA.

 

Que abominável presente de aniversário de 44 anos de fundação – perder 40% de seus servidores, ter atribuições redimensionadas para baixo e ser reduzido a mera secretaria.

 

Direção Nacional da Cnasi

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