Quarta, 15 Setembro 2021 16:23

EM DERROTA PARA GOVERNO, COMISSÃO DE ÉTICA PÚBLICA ACATA POSIÇÃO DO MPF-PFDC SOBRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO DOS SERVIDORES Destaque

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Arte de campanha contra o Assédio no Incra Arte de campanha contra o Assédio no Incra

Embora com considerável atraso de um ano e meio, a Comissão de Ética Pública do Poder Executivo Federal atendeu recomendação da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) – órgão do Ministério Público Federal (MPF) –, e encaminhou em setembro de 2021 mensagem a todos os agentes públicos federais na qual ressalta que exercício do cargo ou função no Serviço Público não retira dos seus titulares o direito de participar dos debates que envolvem a vida coletiva.

A decisão tem como referência o caso de assédio promovido pelo secretário Especial de Assuntos Fundiários, Luiz Antônio Nabhan Garcia, que ficou visivelmente irritado durante audiência pública - realizada no dia 10 de fevereiro de 2020, na Câmara Municipal de Marabá (PA) -, quando a geógrafa e servidora do Incra, Ivone Rigo, fez questionamentos e cobranças sobre melhoria das condições de trabalho na autarquia, orçamento insuficiente e paralisação das atividades no órgão.

Interrompendo a servidora e sendo grosseiro, o autonomeado "vice-ministro" Nabhan disse: “A senhora parece não conhecer de hierarquia. Como uma servidora simples, não dá para vir aqui questionar a instituição”, acrescentando que a funcionária deveria se colocar “em seu devido lugar”. A irritação levou Nabhan a determinar abertura de investigação da conduta da servidora – o que foi prontamente atendido pelo então superintendente substituto do Incra no Sul do Pará, João Itaguary Milhomem Costa, que ainda emitiu nota justificando o ato.

O caso de assédio foi denunciado pela CNASI-ASSOCIAÇÃO NACIONAL e ganhou destaque na época com ampla repercussão em diversos setores da sociedade – na imprensa, no meio jurídico, na política, no Serviço Público. Houve divulgação de conteúdos pela imprensa e entidades de defesa do Serviço Público e seus agentes.

Acesse AQUI matéria de balanço da repercussão do caso no período.

Na época do caso de assédio, uma nota de repúdio conjunta foi emitida pela Cnasi-Associação Nacional, Associação dos Servidores do Incra no Pará (Assincra-PA) e Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Federal no Estado do Pará (Sintsep-PA), bem como se realizou em 18 de março de 2020 um dia de mobilização CONTRA O ASSÉDIO MORAL INSTITUCIONAL NO SERVIÇO PÚBLICO - por meio da realização de paralisações, atos, assembleias, rodas de conversa, dentre outras atividades.

Confira AQUI a nota das entidades emitida na época da denúncia.

Como repercussão no Ministério Público Federal e buscando reparar o caso de assédio, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, por seu grupo de trabalho Reforma Agrária, encaminhou ainda em fevereiro de 2020 à Comissão de Ética da Presidência da República uma Recomendação para que órgãos de toda a Administração Pública Federal e Comissões de Ética que atuam nesse âmbito sejam orientados quanto à garantia do direito à liberdade de expressão de servidores públicos.

Agora, a decisão da Comissão de Ética Pública do Poder Executivo Federal em dar ampla divulgação para a orientação da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão sobre liberdade de expressão dos servidores públicos também teve repercussão na imprensa, a exemplo dos meios de comunicação abaixo:

O Estado de São Paulo
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,um-ano-e-meio-apos-caso-nabhan-comissao-diz-que-servidor-pode-emitir-opiniao-em-debate,70003838918 

Terra
https://www.terra.com.br/noticias/um-ano-e-meio-apos-caso-nabhan-comissao-diz-que-servidor-pode-emitir-opiniao-em-debate,d497aa2ec8af01147718e1ad45a94b64u57b5v3o.html 

Metrópoles
https://www.metropoles.com/colunas/guilherme-amado/comissao-de-etica-da-presidencia-defende-liberdade-de-expressao-de-servidores 

Correio Braziliense
https://blogs.correiobraziliense.com.br/servidor/servidora-do-incra-que-sofreu-assedio-moral-tem-apoio-do-mpf/ 

 

Confira abaixo a íntegra da nota do MPF / PFDC:


Liberdade de expressão de agentes públicos

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal ao qual incumbe dialogar e interagir com órgãos de Estado, organismos nacionais e internacionais e representantes da sociedade civil, buscando a proteção e a defesa dos direitos individuais indisponíveis, coletivos e difusos, recomenda, nos termos da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, a divulgação do texto a seguir sobre a liberdade de expressão de agentes públicos:

A liberdade de expressão constitui direito fundamental que goza de posição de preferência no ordenamento jurídico, circunstância que abrange o estabelecimento de, ao menos, três presunções: i) da primazia no processo de ponderação, de modo que a colisão entre valores constitucionais, em princípio, deve ser equacionada em favor da livre circulação de ideias; ii) de suspeição de todas as medidas normativas ou administrativas que limitem a liberdade de expressão, nas quais se incluem a instauração de processos disciplinares ou com viés intimidatório; iii) da vedação de censura, na medida em que eventuais excessos no exercício da liberdade de expressão – como, por exemplo, nas hipóteses de discurso de ódio – devem ser enfrentados prioritariamente pela via da responsabilidade ulterior.

A liberdade de expressão também tem como vocação a tutela de manifestações de pensamento deseducadas ou de mau gosto, de modo que eventuais incômodos ou inconveniências aos afazeres administrativos aferidos por meio de uma deturpada visão de hierarquia não funcionam como óbices à proteção da liberdade constitucional.

A ordem jurídico-constitucional brasileira não permite, portanto, que o poder hierárquico seja interpretado como vedação ao dissenso no âmbito da Administração Pública, ou mesmo que esse dissenso seja tornado público, ressalvados os excepcionais casos de sigilo legal da informação.

O exercício republicano de autoridade pública, ao revés, deflagra ambiente propício a controle e questionamentos internos e externos que possam alcançar maior transparência e aprimoramentos na gestão pública. Por consequência, o poder hierárquico não permite inferir relação jurídica de especial sujeição que resulte no aniquilamento ou na restrição direta ou indireta da liberdade de expressão das pessoas investidas no desempenho de atribuições públicas.

Nessa ordem de ideias, o exercício de cargo, emprego ou função no serviço público não retira dos seus titulares o direito de participação em debates que envolvam a vida coletiva, principalmente naqueles em que seu conhecimento técnico seja relevante para o processo de tomada de decisões ou de informação ao público.

Logo, não se conciliam com o ordenamento jurídico brasileiro as posturas e condutas de agentes públicos que, sobretudo quando baseadas em razões de hierarquia, promovam a instauração de processos administrativos pelo só fato da participação de agentes públicos em debates e reuniões públicas, especialmente nos casos de formalização seletiva de procedimentos ou que acarretem efeito inibidor ou amedrontador na livre circulação de ideias no âmbito da Administração Pública.

Nesse contexto, condutas que aniquilem, cerceiem ou restrinjam, direta ou indiretamente, a liberdade de expressão das pessoas investidas no desempenho de atribuições públicas, sem prejuízo de constituírem infração de outra natureza, podem contrariar as normas éticas e estarem sujeitas à apuração, por denúncia ou ex-officio, no âmbito do Sistema de Gestão da Ética do Poder Executivo Federal, particularmente pelo contido no Decreto nº 1.171/1994, que instituiu o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal (Capítulo I, Seção I, Das Regras Deontológicas, incisos VII e VIII, e Seção II, Dos Principais Deveres do Servidor Público, inciso XIV, alíneas ‘h’ e ‘i’).

Fonte: Cnasi-AN

Ler 1852 vezes Última modificação em Terça, 21 Novembro 2023 01:11